O legado de Sanders

A editora Alfabeto está lançando no Brasil, "Uma voz na Floresta, conversas com o espírito de Alex Sanders, o rei das bruxas". Ainda não tive oportunidade de ler. Para quem é adepto ou crê no espiritismo, acredito que seja um bom livro, já que o gênero da obra é "psicografia". Não encontrei muitas informações sobre o autor, Jimahl di Fiosa, mas acredito que deva ser uma espécie de Heselton (biógrafo de Gardner) de Sanders, já que pelo pouco que vi, empreende um trabalho de resgate da figura de Sanders. Este apesar de odiado por muitos wiccanos (Patrícia Crowther que o diga), isso se deve em fato pelas questões de legitimidade, ele de fato é dono de um legado gigantesco dentro da moderna bruxaria. este grande legado é confundido por muitos com a noção de publicidade, mas reduzir a influência de Sanders simplesmente a um embate relativo a necessidade midiática é ofuscar sua influência. De fato alguns livros ajudaram a difundir a ideia de que Sanders era um bruxo circense que só ligava para a fama, mas não sei se alguém dedicaria tanto tempo por uma coisa que achasse bobagem. Este livro pelo que andei lendo em algumas resenhas, inclusive uma de Chas S. Clifton, é rico não só para os adeptos da bruxaria e espiritismo (ou ambos) mas para os que se interessam pelo desenvolvimento da moderna bruxaria neo pagã. No caso do Brasil, acredito que deva ser uma obra importante pela falta de bibliografia sobre o assunto, já que os livros sobre a moderna bruxaria e Wicca são extremamente repetitivos. E é praticamente inexistente algum que fale sobre o desenvolvimento histórico da Wicca sem levar em consideração um outro olhar que não seja wiccano (em outras palavras, academico). Não estou dizendo com isso que este livro sobre Sanders irá suprir esta lacuna, mas é uma fonte a mais, pelo menos para quem como eu só tinha uma aproximação maior com Sanders através dos livros de Hans Holser.

A premissa do livro de di Fiosa, é que dez anos após a morte de Sanders, um grupo de bruxas resolveu contactar o rei das bruxas através de uma sessão, o livro é fruto deste contato.Os outros livros de Jimahl di Fiosa são: A coin for the Ferryman: The Death and Life of Alex Sanders e All the King's Children: The human legacy of Alex Sanders.

Algumas observações: 
Para Jeffrey B. Russel, a alegação de Gardner em ter descoberto um grupo de bruxas de uma religião pré existente deu margem a muitas outras pessoas reivindicarem uma ancestralidade anterior à Gardner. Uma dessas pessoas foi Sanders, que "alegava descender de uma família de tradicional de bruxos", Patrícia Crowther conta em "O mundo de uma bruxa" (Ed.Bertrand Brasil, 1998) que Sanders havia enviado uma carta à ela e seu esposo em 1961 depois de uma aparição dos dois na TV dizendo:

Querido Sr. e Sra. Crowther:
Eu os vi na Tv, no programa  "Gente e Lugares", e fiquei tão interessado, que tomei a liberdade de escrever para vocês. "Bruxo" é o tipo de coisa que sempre desejei ser. Mas até agora ainda não encontrei alguém que pudesse me ajudar.

Segundo Patricia, nesta mesma carta Sanders descreve algumas experiências que tem e teve na infância. Uma interessante colocação de Patricia (ela mesmo descreve que nunca escondeu seu desafeto por Sanders) refere-se a suposta iniciação de Sanders por sua avó, aos sete anos de idade. Esta menção à sua iniciação foi primeiramente descrita em "The King of the Witches" (1969) biografia de Alex Sanders escrita por June Jhons. Em sua iniciação Sanders Havia sido marcado em seu escroto por uma lâmina. Esta iniciação é rebatida por Crowther que descreve que na carta que recebera de Sanders, suas experiências recuavam aos doze anos e não sete, além do mais não foi mencionada nem uma avó nesta carta. Sem querer entrar em discussões de legitimação, não é de hoje que questões sobre iniciação estão presentes na moderna bruxaria, a própria iniciação de Gardner (não entrarei e discussão) é um exemplo disso.Voltando a nosso principal personagem da vez, Alex Sanders de fato era midiatíco, pelo menos grande parte dos registros audio visual referentes à Arte vem de Sanders. Mas quem é Alex Sanders? Orrel Alexander Carter nasceu em Birkenhead, Inglaterra, sendo o mais velho de seis irmãos. Como já foi dito ele dizia ter sido iniciado logo em sua infância por sua avó, depois que a viu (numa cena do tipo Código da Vinci) despida no centro de um círculo que havia sido desenhado no chão da cozinha. Sua avó percebendo a presença do neto, ordenou-lhe que entrasse no círculo e que também se despisse. A avó o fez se curvar cortando-lhe o escroto. "Agora és um de nós". Sanders teve muitos empregos, viveu por muito tempo uma vida, podemos dizer, promíscua se entregando as bebidas (em excesso) e ao sexo (em excesso, tanto com homens quanto mulheres). Segundo consta chegou a fazer um dinheiro com magia negra, mas depois se dedicou somente a magia branca e a cura. Na década de 1960 casou-se com Maxine Morris, que tornou-se grande sacerdotisa. Sanders, como dissemos, buscava a fama e os holofotes, estava focado em tornar-se uma personalidade pública. Essa publicidade não tardou a chegar e veio com o filme "Legend of the Witches" (recomendo a todos que vejam).


A exposição excessiva de Sanders provocou a ira de outros bruxos, incluindo Patricia Crowther, claro. Estas atitudes de Sanders levaram muitos a tomarem atitudes para tentar frear essa exposição excessiva. Primeiro, segundo conta Crowther, Bracelin e Ray Bone foram a casa de Sanders conversar com ele, mas não encontraram ninguém, então decidiram esperar no carro, uma espera de mais de duas horas, até que Sanders chegou e os recebeu, mas disse que não iria parar de dar entrevistas ou coisa do tipo. Sendo assim a briga estava armada. Em 1966 Crowther, Ray e outro proeminente bruxo foram publicamente denunciar Sanders. Colocaram em xeque sua iniciação. Sanders se esquivou dizendo que não fora mesmo iniciado na tradição Gardneriana e que sua avó estava numa tradição hereditária muito anterior a bruxaria gardneriana que é muito posterior. É claro que que a bruxaria de Sanders (Alexandrina) é baseada no sistema gardneriano, mas nem por isso deixou de inovar ou acresecentar elementos. Sanders foi muito influenciado pelo pensamento de Eliphas Lévi, isso fez com que Sanders adiciona-se vários elementos de Alta Magia. Devido a estes rearranjos e a forte teatralidade dos rituais alexandrinos, muitos referem-se a tradição alexandrina como "igreja superior" e a gardneriana como "igreja inferior". Como mostra Hutton, esta diferenciação traça uma distinção clara entra as duas tradições, pois Gardner sempre se preocupou em marcar bem uma separação clara entre o Paganismo e o Cristianismo, já Sanders tornou os limites destas duas correntes indistintos. Dava grande ênfase ás técnicas mágicas, como clarividência, projeção astral. Não é a toa que o livro de Jimahl di Fiosa mergulha no espiritismo sem nenhuma culpa. Em suma não é fácil encontrar muitas coisas em português publicadas sobre Sanders. Apesar de muitos terem tido como um exibicionista seu legado é bastante rico. Sanders se vangloriava de ter iniciado 1623 pessoas e mais de 100 grupos. De fato estas cifras deixariam muitos bruxos neo pagãos modernos de cabelo em pé, admirados? talvez não. Mas o fato é que o Rei dos bruxos não pode ser considerado um mero coadjuvante da moderna bruxaria neo pagã, pelo contrário, podemos sem dúvida dizer que é um de seus atores principais.

Comentários

  1. Seu blog é otimo, parabéns!!!
    E o texto está otimo, obrigada pela informação do livro :)

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